É
setembro e a cidade, Lisboa. Acompanha-me um moiro na Calçada de Santo Antão,
vamos à busca de frutos do mar e olhamos absortos as lagostas nadando nos
tanques à porta dos Restaurantes. O vinho é Dão, mas o fado não é o mesmo. O
motorista do taxi disse que não há mais fados para portugueses, exceto os fados
vadios que acontecem nas festas populares. O fado agora é só para turistas e
está sendo cantado em dólar.
Não
sei mais de mim, nem deste fado. Sei da pena escorrendo palavras e sangue e
desta canção estranha que fala de amor e desventuras. O pensamento vaga pelas
vielas estreitas da velhíssima cidade e já não está só, acompanha-o a história
e seus personagens, cavaleiros e discretas damas. Todos os poetas cantam e
fazem roda, exceto Pessoa, que paira calado num café do Chiado que cheira a
açorda. Está só, como sempre esteve, e sem óculos, eles já não lhe fazem falta
- pode ler sem enxergar, viu e disse tudo. Seus poemas, despidas dos signos
convencionais.
Os
espanhóis, por vezo histórico, continuam a invadir Portugal. O grupo de
brasileiros ao lado é excessivamente barulhento e é tão falso este fado! A
única verdade está aqui, cristalina, na garrafa de uma Dão, safra 1984. É
sempre amargo o último gole e o vinho já sabe a saudade. Melhor era nunca
partir.
dalila teles veras, Lisboa,
setembro/1986
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