quarta-feira, 8 de março de 2023

MULHERES MULHERES MULHERES - V Encontro Nacional do Mulherio da Letras, novembro de 2022, em João Pessoa, PB


Naquela segunda-feira, dia 28 de novembro do ano passado, quando sentei e afivelei o cinto de segurança na poltrona do avião com destino a São Paulo, fechei os olhos e tentei processar minhas vivências dos últimos 5 dias e quatro noites, naquela bela cidade de João Pessoa, capital da Paraíba.



Afinal, que furor foi aquele? Que tipo de energia emanou das vozes e da escrita daquela centena de mulheres vindas de vários estados do Brasil e algumas poucas do exterior, para o V Encontro do Mulherio da Letras? Todos aqueles rostos, aquelas vozes, dezenas de livros na bagagem me dizem que foi um verdadeiro acontecimento, explosão cósmica, estelar.

Processar, entranhar e refletir sobre tudo aquilo foi uma tarefa difícil para quem volta à rotina massacrante do seu lugar. É o que tento fazer agora, ainda que tardiamente, mas não por acaso, na semana/mês em que se comemora mundialmente o Dia da Mulher, ou melhor, O Dia de Luta das Mulheres.




A primeira providência foi pisar na areia, aspirar a maresia, contemplar o azul do céu e banhar o corpo no sal, sabendo que é possível, sim, olhar para trás, sem perigo de virar estátua, viu Ló?"

Vamos ao começo dessa história. O Movimento Mulherio das Letras, criado em 2017, conta hoje com adesão de mais de sete mil e quinhentas mulheres brasileiras residentes no Brasil e muitas no exterior.  
 
São poetas, ficcionistas, dramaturgas, tradutoras, pesquisadoras, críticas, editoras, livreiras, ilustradoras, designers e jornalistas, muitas das quais ativistas culturais e sociais, ligadas a movimentos coletivos.
 
Trata-se de uma iniciativa precursora, criada, a princípio, sem grandes pretensões, a partir de uma discussão de um grupo de mulheres que participavam da FLIP em 2017, sobre a rala presença das mulheres no cenário das Feiras, Festivais, Prêmios e outros. A ideia partiu da premiada escritora Maria Valéria Rezende, santista de nascimento mas residente há muitos anos em João Pessoa, personalidade extraordinária de nossas letras, que seguiu como uma de suas principais ideólogas, motor inspirador em todas as etapas do coletivo. A partir de uma página criada a seguir no Facebook, com a adesão sempre crescente de mulheres interessadas em discutir e promover ações. 

 
O I Encontro Nacional do Mulherio das Letras, em João Pessoa, já delineava o que viria nas próximas ações do Movimento, ou seja, organização coletiva, democrática e sem hierarquia, sem mesas, conferências, curadoria, sem cachês. Assim foi e assim tem sido.
 

De acordo com a chamada “Carta do Guarujá”, elaborada no II Encontro, em 2018, “é um coletivo feminista literário, diretamente interessado na expressão pela palavra escrita e oral, que se propõe a discutir as questões da mulher nas áreas da arte e da cultura.”, sem descuidar de ações na luta pela igualmente de direitos e a favor da vida. (veja ao final, a carta, na íntegra.

Nestes cinco anos de atuação, tornou-se verdadeiro divisor de águas no rio das letras e da literatura produzida por mulheres em todo o processo de escrita e edição.
 
Havia muitos motivos e significados simbólicos a reparar e celebrar neste V Encontro, como o fato de voltar a ser realizado em João Pessoa, cidade que o acolheu o I Encontro, em 2017. Celebramos os cinco anos do Mulherio e também os 80 anos de idade de Maria Valéria Rezende, por motivos óbvios, a homenageada deste Encontro. Fui incumbida da honrosa tarefa de saudar com algumas palavras a querida Maria Valéria.
 
Nos primeiros quatro encontros nacionais foram homenageadas mulheres de vulto que tiveram sua obra e vida apagadas e invizibilizadas ao longo de séculos, mas que hoje são publicadas, estudadas e reconhecidas, nacional e internacionalmente. Maria Firmina dos Reis, a primeira romancista brasileira, homenageada no I Encontro em João Pessoa; Patrícia Galvão – Pagu, nome indissociável do Modernismo brasileiro e das lutas políticas pela democracia, homenageada no II Encontro, no Guarujá, SP; Nísia Floresta, homenageada no III Encontro, em Natal, RN; várias autoras foram homenageadas no IV encontro, em Porto Alegre, o primeiro no formato virtual, tais como Maria Helena Vargas da Silveira 1940-2009, Lara de Lemos -1963-2010 e Elaine Brum, Lilian Rocha, nossas contemporâneas.
 
Vamos aos bastidores que rivalizam em qualidade (e diversão) com as mesas e rodas de conversa. E aqui já peço desculpas pela total autorreferência. Como evitar? Esta que escreve agora era aquela que estava lá e recebeu todos os impactos das discussões, dos abraços, das apresentações dos livros, inclusive, o de estar ao lado de minha filha Isabela Veras que, lançava ali, seu primeiro livro, coLateral.

A caderneta moleskine de capa rosa, veio preenchida com notas pontuais e descritivas dos acontecimentos decorridos nos dias 24, 25, 26 e 27, quinta, sexta, sábado e domingo, ao lado de uma centena de mulheres. Nada de digressões filosóficas e analíticas. Não havia tempo. Viver e entranhar fazia-se urgente.

Empório Café - Tambaú


Desde o “esquenta” no Empório Café, em Tambaú, com um grupo pra lá de especial, até o encerramento, passando pela abertura no Teatro da Usina Cultural ENERGISA, um belo casarão com lindos jardins, onde quase toda a programação foi realizada. Após a abertura, uma memorável “esticada” no “Bar do Baiano”, bairro Bancários.  As rodas de conversa, oficinas e vivências nos jardins e no Teatro da ENERGISA, almoço no “Olho de Lula”. 

"Bar do Baiano"  a esticada após a abertura

primeira sessão dos abraços 

Lançamento dos livros dtv e Isabela Veras



a turma do vamos lá trabalhar





porque é hora de abraçar e despedir

"decanas", mas jubiladas jamais


Ciranda - afiinidades eletivas

E ainda houve tempo para uma tarde mágica no já mítico jardim indomável de Maria Valéria


O abraço e admiração pelas cineastas

Mais abraços pois é hora de ir embora



a plateia à espera, no cine Banguê





a fala da cineasta Laís Chafe

a cineasta - o abraço e admiração


espera e muita conversa
 

A aguardada Avant Premier do documentário “Mesmo que tudo dê errado, já deu certo”, um longa de Laís Chafe e Neli Germano, sobre a eterna musa do Mulherio,  Maria Valéria Rezende, lotou e emocionou a plateia do cine Banguê no Centro Cultural José Lins do Rêgo. Foi um dos pontos altos do encontro.

Lançamentos de livros em locais diferentes na cidade, à noite e, novamente, esticada ao Pub Patcha Mama. Conversas e surpresas sem fim.

o Mulherio rende-se à sua "musa"

Abertura - fala a homenageada



em louvor a MVR a homenageada

 







Mulheres, mulheres, altas, baixas, magras, cheinhas, clássicas e extravagantes. Mas quem se importa com detalhes com tamanha diversidade de corpos e intelectos? Importam os abraços, os livros trocados, as ideias postas e discutidas, a cumplicidade na luta preconizada pela trajetória e pelo próprio momento: Dizem as estatísticas que em 2022, no Brasil, uma mulher foi morta por feminicídio a cada dia. A cada 24 minutos, uma mulher sofreu algum tipo de violência. Sem contar a violência diária sofrida por mulheres no trabalho, na rua, na própria casa que deixou de ser registrada. Ali, o luto se fez promessa de resistência.

No domingo de manhã, o encerramento no teatro da ENERGISA, com avaliações, trocas de informações, sugestões e experiências, não sem algumas polêmicas, que, afinal, fazem parte da diversidade ali representada. Por fim, foi lida a carta manifesto do Encontro que, assim como a anterior, chamada carta do Guarujá (II Encontro, vide no final) reforça as premissas, resistência e compromissos do Mulherio das Letras. 

leitura em voz alta - escuta


mais retratos para lembrança


(re)reconhecimento



um momento para guardar


Reencontros

Mulherio Indígena e suas Letras

Trocas
para guardar

avaliação do encontro

é debatendo que se avança
escambos

meu livro em boas mãos


O bloco da animação


mais trocas


avaliação do resultado de oficinas




momento ternura entre gerações

"A esperança é cortada, mas se regenera". (Pagu)

Carta Aberta do II Encontro Nacional do Mulherio das Letras 2018

O Mulherio das Letras, criado em 2017, é um coletivo feminista literário, diretamente interessado na expressão pela palavra escrita e oral, com adesão de mais de sete mil mulheres brasileiras residentes no Brasil e no exterior, que se propõe a discutir as questões da mulher nas áreas da arte e da cultura.

As mulheres reunidas neste encontro, diante da atual e grave conjuntura do Brasil, se comprometem a defender as seguintes pautas:

1. O exercício pleno e irrestrito da democracia;

2. A liberdade de expressão;

3. A garantia e ampliação das políticas públicas para o livro, a leitura, a literatura e as bibliotecas;

4. Salvaguardar os direitos das mulheres, bem como fortalecer e dar visibilidade à literatura produzida por elas;

5. Comprometimento com a defesa da diversidade étnica, de gênero, de classe, de orientação sexual, bem como com a inclusão das mulheres com deficiência;

6. A defesa da educação e, especialmente, da universidade pública, gratuita, laica, de qualidade, inclusiva e aberta à comunidade;

7. A resistência ao sucateamento e desmantelamento dos equipamentos culturais e instituições públicas.

Paralelamente, o Mulherio das Letras realizará ações efetivas nos níveis regional, nacional e internacional, no sentido de manter permanentemente mobilizado o Movimento.

Comissão de redação:

Cátia Moraes

Dalila Teles Veras

Giovana Damaceno

Lindevânia Martins

Patrícia Vasconcelos

Rejane Souza

Rosana Chrispim

Carta aprovada com acréscimos e supressões na leitura pública deste documento no encerramento do Encontro.

Guarujá-SP, 4 de novembro de 2018.