Domingo 08, hoje, mês do Carnaval. O baixo Augusta fervia.
Gente, muita gente. A estação Consolação despejava umas 1000 pessoas por minuto,
jovens e coloridos, na sua maioria, que desciam rua abaixo, cerveja na mão e diversão
na cabeça (ops... não seria no pé?). De túmulo do samba, para a capital dos
blocos, São Paulo, é a cidade que sempre
surpreendente.
Como não aprendi a dançar nem a seguir bloco e já sem
paciência para começar e muito menos pernas pra aguentar maratonas,
refugiei-me, como de hábito, no cinema. Oscar? Coisa nenhuma. Primeiro, porque
as sessões dos filmes concorrentes ao prêmio já estavam todas lotadas com muita
antecedência. Segundo, porque gosto sempre que possa de prestigiar o cinema
nacional. Acertamos, desta feita, em cheio, Brincante, um filme de Walter
Carvalho sobre e com o grande artista Antônio Nóbrega. Nada mais apropriado do uma
hora e meia de puro lirismo dançante para este mês de samba.
Walter Carvalho (Central do Brasil, Amarelo Manga, etc. e
tal) arrasa nas tomadas, na luz, na ousadia dos incríveis enquadramentos. Mais
do que um adorável passeio pelo universo fantástico da arte desse múltiplo
artista, constituído pelo amálgama da erudição e da cultura popular brasileira
que por sua vez vai lá atrás beber do trovadorismo e do nosso imaginário, o
filme é uma grande homenagem a São Paulo, onde mais de metade do filme é
ambientado, cidade onde o artista fixou residência e montou o já lendário
Instituto Brincante (à beira do despejo e do desprezo local).
O diretor optou por um documentário que não é exatamente um
documentário, mas também não é exatamente uma ficção (vale-se de personagens de
ficção encarnados pelo próprio Nóbrega) e dispensa praticamente a palavra. A
história desse artista é contada através de sua própria arte. Um artista que
"brinca" a sério. A viagem da "fubica", uma velha camionete
que serve de casa, palco e teatro sobre rodas, por ele mesmo conduzida, sempre
acompanhado de sua parceira na vida e na arte (a atriz Rosane Almeida) é
metáfora dessa trajetória. Inicia percorrendo cidades estradas de terra do
Estado de Pernambuco (Nóbrega, como se sabe é pernambucano), entra e se fixa,
como ele mesmo se fixou, na cidade de São Paulo.
A paisagem interna (o palco, o recolhimento do estúdio) vai
se alternando com a externa (a dança de rua), ora no alto dos edifícios e
viadutos, ora nos parques, no vão livre do MASP, na Av. Paulista e muitos
outros locais, apropriando-se da cidade, palco a céu aberto cenário de
belíssima coreografias. A trilha sonora, criada em processo colaborativo, é a
cara disso tudo, a cara do Brasil.
Suassuna teria adorado ver seu pupilo ali, na telona, em
pleno vigor de seus mais de 60 anos, arte nordestina/brasileira nas veias,
talento levado às alturas.
Como disse, na estreia, o diretor Walter Carvalho,
"cinema não é pra ganhar Oscar, mas para emocionar pessoas".
Emocionei-me, voltei mais leve e com mais orgulho desta terra que elegi como
minha. (dtv)
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