"Rua sem saída”, anuncia a placa no início da rua, na cidade de Santo André. Só que não é bem assim.
Adentrando a porta da última casa da rua Cuiabá, a de número 153, local onde a arte habita, penetra-se também no mistério e no encantamento. Se o visitante (que só poderá visitar o ateliê-casa mediante agendamento prévio), mostrar-se delicado, interessado e interessante, a proprietária do local, acabará por lhe mostrar a passagem secreta para o quintal/garagem e, finalmente, a saída para outra rua. Uma placa, portanto, nunca diz tudo.
A Cuiabá 153 é um portal para um mundo a descobrir. Tudo ali respira criação e um certo ar de mistério.
Para os que acompanham a história do local e a rebeldia que
ali ocorre há cerca de uma década, essa sensação já está introjetada. Chegam
como quem é “da casa”, a rua (con)fundida ao Cuiabá 153 – Galeria, Espaço
Cultural, Casa ateliê da artista visual Sueli de Moraes, ou simplesmente, Suca,
como é conhecida e reconhecida.
Tudo ali começou com reuniões “descompromissadas” entre pares, depois, em 2014, veio a ideia da parceria com um projeto realizado na França, Les Fenètres qui parlent”, onde reside uma de suas filhas. Assim, em diálogo com as janelas francesas, nasceu “Portões que Falam”, uma extraordinária instalação de arte pública, promovida em anos diferentes, por quatro edições, a pandemia atrapalhando no meio delas.
A cada dois anos, Suca e os participantes da ação de arte
pública, vão de casa em casa, não só da rua Cuiabá, mas em várias outras ao
redor. Na última edição foram sete ruas. Conversam com os vizinhos, tentando
convencê-los a ceder seus respectivos portões para a realização da intervenção.
Foi difícil, mas ela e aqueles que toparam ser seus pares, conseguiram, tanto
que na última mostra, 2022, participaram mais de oitenta artistas envolvendo o
mesmo número de residências que cederam espaço para as intervenções.
Pois bem, feita essa longa introdução, necessária, no meu
modesto modo de ver, para falarmos do que aconteceu ali no último sábado, 28 de
janeiro.
O coletivo Sábados PerVersos, ligado à livraria e espaço
cultural Alpharrabio, há oito anos ininterruptos
unido por suas reuniões mensais no espaço físico da livraria e outros locais,
inclusive, virtuais, como nos dois primeiros anos da pandemia, recebeu um sedutor convite de Suca que foi
alegremente aceito.
A ideia era visitar a exposição “Além da superfície”, a primeira individual da jovem artista Vitória Fogaça, instalada e aberta à visitação de 02.12.22 a 04.02.23. Mas não seria uma visita qualquer. A sugestão foi de uma imersão poético-visual na mostra, ou seja, um diálogo entre as obras expostas e as possíveis leituras das visitantes, Vanessa Molnar, Rosana Chrispim, Ciça Lessa, Márcia Plana, Nathaly Felipe Alves, Isabela Agrela T. Veras, Luzia Maninha Teles Veras e a autora deste texto, além, naturalmente, das anfitriãs, Suca e Vitória. Dez mulheres, muitas histórias a se cruzarem. Muitos questionamentos e reflexões.
Após uma monitoria da curadora Suca, logo à chegada e da apreciação individual das obras expostas, seguiu-se uma imersão gastronômica em sabores e cheiros, a título de intervalo para almoço.
A própria Suca, que entre as muitas habilidades, além de sua
formação em arte, também é graduada em gastronomia e hábil na alquimia de
sabores, foi para a cozinha que, diga-se, faz pare do ambiente. Preparou
“nhoque” ou inhoque ou gnocco, em italiano, acompanhado de um espesso e
perfumado molho de tomate e ervas secretas, mais uma saladinha e água
aromatizada com folhas de manjericão, vinda dos canteiros laterais da
casa. Aproveitamos a ocasião festiva e abrimos umas garrafas de
vinho, também para celebrar o aniversário de uma das visitantes presentes,
Márcia Plana, que generosamente preparou um bolo de sabores igualmente
misteriosos, para servir na sobremesa.
Plenas de ver, saborear e ouvir, fizemos uma roda de conversa com a Vitória, autora das 12 obras da mostra, em técnicas e materiais diversos.
Vitória nos disse que, a princípio, o trabalho nasceu numa
pesquisa que vinha realizando sobre o corpo, presença e ausências; fases da
infância, entre outras. Durante a primeira fase, uma série de inusitados
desenhos em papel, que tiveram partes recortadas, no sistema calcogravura. Os
pedaços recortados, foram colados a outros desenhos dando-lhes outros sentidos,
numa segunda obra.
A poeta tenta capturar o momento pós-imersão |
A tarde caía sobre os paralelepípedos da Cuiabá, quando cada uma das presentes rumou para seus respectivos destinos, com a promessa de transformar essa experiência em arte ou qualquer outra coisa, um poema, uma crônica, um artigo, neste meu caso, dando por cumprida a imersão e vindo à tona com a promessa cumprida.
Dalila Teles Veras, início de fevereiro de 2023
Muito bom.Parabéns.abraços do Pantanal
ResponderExcluirmuito obrigada. abraços de Sto. André
ExcluirDalila, que prazer ler e vivenciar novamente este Sábados PerVersos com a Cuiabá 153.
ResponderExcluirNão é novidade o quanto gosto de te ler e ouvir. E ter o meu nome mencionado em seu blog, é sinceramente, uma honra.
O seu artigo é um convite ao pertencimento. Se eu não fosse a Suca, certamente teria desejo de fazer parte dessa turma de cdf's (rs) só pra ter experiências tão bem descritas como as que
tivemos no referido sábado.
Amei a introdução, obrigada 🤩, as referências todas, as fotografias!... pra mim, um texto que não seria diferente do impecável.
Só tenho a agradecer ao Universo por ter conhecido você, Maninha e a família Alpharrabio.
O meu coração é só amor e contentamento pela experiência que tivemos neste sábado de arte, poesia, gastronomia e abraços. Até de Maninha ganhei um quase abraço. Um quase abraço dela é para poucos, pouquíssimos! :D
Quiçá tenhamos mais encontros como este!
Abçs
Suca
Que bom ouvir isso de você, querida Suca. Seguimos, juntas, pela arte e a convivência fraterna entre pares. Abraços
ExcluirQue lindo, Dalila. Você me transportou pro dia do encontro e permitiu que eu vivesse um pouco daquela emoção. E a Suca! Ela é uma mulher admirável que abre generosamente sua casa mágica. Quem já foi ao Cuiabá153, sabe bem o universo amoroso que é. Obrigada, Suca e Dalila, por tanto ❤️
ResponderExcluirParabéns a todas que participaram desse encontro. O BLOG ficou ótimo. O texto puro sentimento poético. Que venham mais e mais encontros como este. Felizzzzzz 2023!!!!!
ResponderExcluirWilson Rodrigues
ExcluirEste comentário foi removido por um administrador do blog.
ResponderExcluirDalila, Parabéns pelo tocante registro que produziu deste encontro tão especial que vivenciou junto a Suca e as demais artistas . Belo texto! A introdução, nos conduziu com curiosidade até a Cuiabá 153, conseguiu deixar esta linda casa , ainda mais interessante e acolhedora do que já é!!!
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Muito obrigada!
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