Sob
o título “Memórias insulares”, esta generosa leitura crítica de “solidões da memória",
pelo jornalista e ficcionista Daniel Brazil, publicada no seu prestigiado blog
"Fósforo", no dia 16.2.2016:
“Terra,
Quando
te cinges de água,
Tanto
mistério se encerra.”
(de
uma antiga canção praiana)
Termino a leitura de Solidões da Memória (Dobra Editorial/ Alpharrabio, 2015),
de Dalila Teles Veras, com a sensação de ter compartilhado uma viagem
atemporal. Mais que um conjunto de poemas, o livro é o itinerário poético e
existencial de uma menina nascida na ilha da Madeira que vem para o Brasil com
onze anos e retorna, adulta, ao cenário da infância.
A primeira parte do livro, que tem o belo nome de Insularidade, é primorosa.
Lançando mão de epígrafes de poetas e fadistas de ambos os lados do Atlântico,
Dalila nos revela em cada poema fotogramas de um filme íntimo cujas sensações
podem ser intransferíveis, mas são ali compartilhadas.
Havia
manhãs
em
que ao abrir da janela
era
só o mar e o mar
o
mar
o
mar
o
mar.
Poesia quase tátil, de uma criança cercada pelo mar quase infinito. Cada poema
é um indício e uma construção. A escola, as primeiras letras, os trajetos
circulares, as personagens esculpidas em vento e sal. A paisagem vai ganhando
nitidez ao nosso olhar também salgado de lembranças.
O breve capítulo “aventura em
preparo” fala da última fotografia na ilha e do baú de viagem, feito pelo
tio. “Ali, na austeridade da arca/ a casa/ reduzida ao essencial.”
A terceira parte, “travessia e chegada/ ruptura” enriquece ainda mais o leque
de imagens e sensações. “onze foram os dias/ enjoo, sarna e tédio”. O primeiro
porto, Recife, revela os “torsos negros azuis suados/ e o cheiro despudorado/
do abacaxi a anular o resto”.
A
quarta parte, “regresso ou tentativa de”, é a mais pungente. Quem retorna ao
Funchal não é mais a menina, mas a mulher adulta, vivida, que já não cabe na
ilha (ou em outro lugar qualquer). Busca a “paz impossível” no mergulho da
memória, e parafraseia Drummond: “a madeira não é apenas fotografias (…)/ mas
é/ a memória do que não foi/ e sequer dói”.
O
livro se completa com um indispensável roteiro (“dos registros prévios”), onde
a autora investe na palavra rizoma e todos os seus significados. Ali
explicita que “o mar invade os sentidos, especialmente o olfato e o olhar, mas
é o subterrâneo que me interessa.”
Eu,
nascido também à beira mar de outra ilha, a qual chamam continente, e
transplantado para São Paulo com dez anos, mergulhei na “líquida travessia” de
Dalila Teles Veras como se levado pela mão de uma amiga de infância. E,
confesso, voltei outro.
voltamos outros... vi (escutei) palavras nascendo ao berço em momentos acolhedores em outra casa, da palavra, das palavras, rizomas, poesias, pela presença da poeta que muito estimo, desde caminhos com os pés nas ruas numa praça em Mauá, meu berço e fonte, agora navega águas do Grande ABC... levo as palavras da poeta na mochila onde estiver e leio aos ouvidos que educam raízes de muitos sentidos, meninas e meninos desta querida cidade: santo andré de dalila
ResponderExcluirobrigada, caro Edson, por sua leitura e atenção de sempre. Abraços
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