sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Jornal de Viagem X - No Reino da Dinamarca - Parte final

Antes que agosto acabe, fecho aqui o jornal de viagem e tentarei "sair" da viagem que em mim permanece, mesmo depois de um mês da chegada a Ítaca. Urge (re)começar a pensar em outras, inclusive as de ordem literária.

Após termos atravessado, de ferry, o estreito de "Öresund", chegamos a Copenhagen, capital do Reino da Dinamarca. A atual Rainha, Margrethe II, ao que parece, muito popular e estimada pelos habitantes das terras Vikings, inclusive por seus dotes intelectuais e artísticos (possui trabalhos como ilustradora, designer de cenografias para teatro e indústria textil, bem como traduziu obras literárias do francês).



Na cidade das bicicletas, não se poderia esperar outra coisa: congestionamento de bicicletas



Bicicletas para trabalhar, para passear, para alugar, bicicletas táxi



Como em toda cidade "turística", inevitável escapar dos "cartões postais", como o sedutor Castelo Kronborg, conhecido por Elsinor (localizado em Helsingor, cerca de 40 km do centro de Copenhagen) onde uma das mais famosas tragédias de Shakespeare, a do infeliz e trágico príncipe deste reino, é ambientada ("Em Elsinore ao contrário o mal era um veneno / Subtil / Invadia o ar e a luz - penetrava / os ouvidos as narinas o próprio pensamento / O amor era impossível e ninguém podia Libertgar-se", Sophia de Mello B. Andresen). O castelo tem sido palco para muitas representações da peça Hamlet, inclusive para marcar o 200° aniversário da morte de Shakespeare. Assim como também é impossível escapar do mais famoso escritor dinamarquês, Hans Cristian Andersen,  largamente cultuado em toda a cidade de Copenhagen.








Muito menos ainda "escapar" (e quem deseja?) da escultura a pequena sereia (Den Lille Havfrue, de autoria de Edward Eriksen, em 1913). Localizada à beira mar nas proximidades do Porto, tornou-se um símbolo, verdadeiro ex-libris da cidade, muito procurada por turistas. Impossível não ficar comovida diante da força do imaginário literário, que tem a capacidade de transformar em real um criações do imaginário.




Pelo fato de ser esta a segunda vez que visitamos a cidade, pudemos nos dar ao luxo de  evitar alguns dos seus clichês (sempre imprescindíveis e inevitáveis de uma primeira vez) e tentar encontrar atrações menos concorridas, nesta tranquila cidade, capital de um país considerado o país com menor índice de desigualdade do mundo e com um altíssimo nível de bem-estar social. Assim, pudemos ver uma bela exposição sobre os Vikings, no Museu Nacional



luz, som, projeções, ambientação estonteante (a simulação da navegação de um barco Viking chega a provocar enjôo de tão real).



e interessantístimos objetos de achados arqueológicos do Século VIII



Outra mostra que valeu a pena foi "Degas´Metode", ou seja, exposição de caráter "didádito" sobre o método de trabalho e crição do impressionista Degas,



no acolhedor museu de arte Ny Carlsberg Glyptotek (esse Carlsberg é mesmo o que você está pensando - o Museu foi fundado a partir da coleção de um filho do dono da famosa fábrica de cerveja)




E, por fim, a descoberta maior, a novíssima Biblioteca, conhecida pelos locais como Diamante Negro, pelo fato de ser revestida de granito preto polido.




Este incrível edifício, projetado  por Schmidt, Hanner & Lassen, é um anexo da Biblioteca Real da Dinamarca, e está ligado em perfeita harmonia ao edifício antigo por passarelas aéreas para pedestres. 



Localizada na avenida que margeia o Porto, conta com um auditório para concertos com 600 lugares, salas de exposições (tivemos oportunidade de visitar uma delas, sobre o filósofo dinamarquês Kierkegaard. Aqui, alguns de seus originais (quanto fascínio exercem essas cadernetas, ainda que não se possa decifrar nada ali): 



Livraria (Deus meu! quanta tentação), restaurante e café




Do interior, esta vista deslumbrante para o estreito de Öresund e os antiquíssimos edifícios à margem


 um lugar para "morar", permanecer ali por tempo indeterminado, flanando entre o mundo antigo e o que há de mais moderno (são disponibilizados ao público computadores com acesso gratuito à Internet, sem qualquer espécie de burocracia. A qualquer momento é possível encontrar um deles livre, pois os há em grande quantidade, em todos os cantos da Biblioteca).


 O dia finda (ou melhor, nesse horário, o dia ainda está longe de acabar) sob uma inacreditável (pelo que se pode deduzir na "intervenção" feita no relógio, não foi só eu que duvidei) temperatura de 27 graus centígrados no frio reino da Dinamarca. Nada mal para uma noite de despedida. (dtv)


quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Jornal de viagem IX - Reino da Noruega - Fim

Muito haveria ainda a dizer (e mostrar) desse país encantador (dá pra perceber o quanto foi, ao menos para mim, apaixonante conhecê-lo), mas juro que este será o último post sobre o Reino da Noruega. No próximo, encerraremos a viagem. Afinal, urge voltar ao chão pátrio e retomar a rotina de "outras viagens", cotidianas.

Algumas das encantadoras cidades norueguesas que visitamos:


LILLIHAMMER

Nesta minúscula e bucólica Lillihammer (26.000 habitantes), conhecida estação de esqui, lembrei-me dos muitos comentários que leio em nosso país sobre o Brasil não "estar preparado para a copa" e "nem para isso" e "nem para aquilo".
Aqui, onde às 7,30 da noite os pouquíssimos restaurantes não servem mais nada, pois tudo acabou e fecham às 20h, foram realizados os Jogos Olímpicos de Inverno em 1994 e voltará a sediá-los em 2016. Pelo que sei, deu tudo certo no passado e não me pareceram muitos preocupados com isso. São o que são...









BERGEN

Bergen, fundada em 1070 e Capital da Noruega até 1299, é hoje a segunda maior cidade do país (250 mil hab.). Porto importante desde o final da Idade Média, pertenceu à Liga Hanseática, poderoso monopólio mercantil, posteriormente também político, durante séculos em todo o Norte da Europa e Báltico. 





Este interessante conjunto arquitetônico, denominado Bryggen, foi declarado Patrimônio da Humanidade pela UNESCO. Foi o que restou (alguns edifícios foram reconstruídos, de um grande incêndio em 1702) daquela época.



Chove 270 dias ao ano em Bergen. Sortudos, ganhamos de presente dois lindos dias de sol que não entraram nessa molhada estatística.

Alguns dos produtos do mar no mercado ao ar livre, no Porto:


caviar (preto granulado grande, granulado pequeno, translúcido, etc.)




 

e o famoso queijo de leite de cabra, de cor amarronzada (o aspecto é de doce de leite e... tem gosto de doce de leite):



LOFTHUS

A pequena Lofthus, conhecida como o "pomar da noruega" (grande cultivo de cerejas, maças, ameixas e peras),  fica à margem do fabuloso Fiord Hardanger (179 km de extensão - da montanha ao mar aberto, e, em certos trechos, 1.500 de profundidade)


Estas fotos foram feitas a partir do hotel  às 22h, plena luz solar, temperatura de aproximadamente incríveis 25 graus (sorte é sorte...).


Na outra margem, atrás da montanha, vê-se o topo do glaciar Folgefonna, um dos raros que ganharam volume de gelo nos últimos anos (e o frio de suas não sei quantas toneladas de gelo, misteriosamente, não chegou aqui).






(psisss... com licença de Vossa Majestade, caro Harald V e caríssima rainha consorte (com sorte, de fato), plebéia como eu, mas num lugar destes,  somos todos (ou sentimo-nos) verdadeiramente  "majestades"!



Em tempo: nos jardins do hotel (da rede de hotéis históricos), que existe desde o Séc. XIX, sempre com a mesma família, está preservada uma minúscula casinha de madeira. Nada mais nada menos do que um singelo estúdio, com alguns móveis e objetos, onde o compositor Edvarg Grieg costumava trabalhar quando, por longos períodos, aqui se hospedava. 



Nosso guia Kim, homem culto e sensível, providencialmente, colocou pra tocar na despedida deste mágico lugar, a abertura de Peer Gynt (Morning Mood) de Grieg, esta:
pra tocar um CD com a abertura de Peer Gynt (Morning Mood) de Grieg, esta:





OSLO

Oslo (os noruegueses pronunciam algo parecido (Uslou, cujo significado é "Morada dos Deuses"), antiga Christiania, é uma cidade de quase um milhão e meio de habitantes






apesar de ser a capital de um país rico e altamente desenvolvido, apresenta, como é de se esperar. alguns problemas de cidade grande, como o aumento crescente do consumo de heroína (aqui o dependente é tratado simplesmente como um "doente" e alguns chegam a receber pensão por "invalidez". Diariamente, pela manhã e à tarde, ambulâncias percorrem o centro da cidade, com enfermeiros, psicólogos e outros profissionais, se o paciente aceitar ajuda, tudo bem, levam-no, caso contrário aceitam sua decisão de ficar na rua, desde que não perturbem, claro, a ordem pública).

nova Ópera

País em batalha contínua com o mar, a Noruega aceita o desafio e avança, inclusive com edifícios, como a nova e bela casa de Ópera, construída literalmente sobre a água.


Museu Munch

Em seus mil anos de existência, Oslo modernizou-se e cresceu, entretanto, sem matar o que era, preservando o que deve ser preservado. 

Curiosidades norueguesa:

-a polícia não usa armas de fogo
-o Primeiro Ministro vai trabalhar de bicicleta e anda de metrô
-a licença maternidade é de 12 meses podendo ser ampliada (com vencimentos menores) por mais 6 meses
-os fertilizantes são proibidos no cultivo dos produtos alimentícios e o campo é largamente subvencionado (o crédito barato garantiu o homem na agricultura que é praticada em apenas 3% do território)
-3º país do mundo em renda per capita (só perde para Katar e Dubai, mas ao contrário desses que apenas ostentam, aqui a riqueza é distribuída equitativamente.
- de país importador de petróleo até 1970, passou não só a explorar (e cada vez se descobre mais petróleo) como a exportar tecnologia para exploração. O petróleo é totalmente nacionalizado. O fundo de garantia de Petróleo (4º sobre as vendas) garante pensões aos cidadãos noruegueses por 200 anos.
- os salário são altos, mas o custo de vida é altíssimo (Oslo é uma das capitais mais caras do mundo)
- todo esse bem estar social tem um custo e é fortemente fiscalizado: o imposto sobre salários é de 52% e a sonegação é baixíssima;  aposentadoria só aos 67 anos (e estão estudando estender um pouco mais a idade).

O ritual (descrito por um local) para degustar um autêntico smörgasbord, típico buffet escandinavo, implica em levantar da cadeira 5 ou 6 vezes, assim:
1) arenques (de diferentes formas), nada de acompanhamento. Pecado mortal comer arenque com qualquer acompanhamento;
2) Salmão marinado, defumado, frio ou quente, acompanhado de legumes
3) saladas e sopas (geralmente há um só tipo de sopa, acompanhada de pão
4) Pratos quentes (pecado mortal misturar peixe com carne, se optar pelos dois, terá que saboreá-los separadamente, um prato de cada vez
5) carnes: alce, rena, baleia, carneiro, etc.
6) sobremesas, as mais diversas

Para digerir e queimar o excesso deste pantagruélico banquete, Acquavit (aguardante de cereais, que também leva batata e ervas na sua composição). É permitido repetir a dose que deve ser ingerida de um gole só (glug...). 

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Jornal de Viagem VIII - ainda a Noruega


Curiosidades sobre a Noruega 



1) OS SAMIS

Os Samis, minoria étnica nômade mais antiga da Europa, que habita parte da Rússia, Finlândia, Suécia e Noruega (na chamada Lapônia, dizem, vivem hoje cerca de 32.000 samis, autênticos, sem miscigenação, numa área de 390.000 km2). Cultivam o idioma "sami" e, desses, 20.000 vivem na Noruega, país que os reconhece e integra e possuem um Parlamento independente. Só para se ter uma ideia até onde vai essa inclusão, os samis conquistaram  o direito de estudar seu idioma nas escolas, com direito a cotas na Universidade. Como são nômades, o governo fornece para as famílias computadores com programas especiais e envia ônibus com professores e bibliotecas que percorrem todo o extremo norte do país a cada 30 dias para atender as crianças.  Não por acaso, os samis não  mais aceitam serem chamados de "lapões" cujo significado é "proscritos".

Na inóspita paisagem do altiplano de Hardanger (2 hab. por km2), tivemos a sorte de encontrar estas curiosas casinhas em forma de iglu, mas com uma técnica ainda norueguesa ainda utilizada, a dos telhados de grama (*) 



Aqui os samis comercializam seus produtos no verão (no inverso chega cair um metro de neve numa única noite), quase todos oriundos de sua principal atividade, a caça (renas)




Na ocasião, conheci uma representante autêntica desse povo tão antigo que, como requerem os bons tempos, falava (mal) inglês.



Empolgada, "paguei um mico" de turista, comprei uma touca apropriada para o clima deles que, sei, jamais usarei.

(*) os telhados de grama, antiga técnica vicking, são térmicos e protegem do frio. A técnica é a seguinte: sobre uma espécie de caixote de madeira dura (carvalho ou outra) com uma base de 25, vão colocando sucessivamente camadas de cascas de bétula e de terra, até completar 7 camadas. Prensam bem de na última camada de terra plantam a grama e outros arbustos. As raízes vão se entrelaçando e, após o primeiro inverno, com a umidade da neve, o telhado fica compactado e dura cerca de 30, 35 anos. Para aparar o telhado? coloca-se um carneiro lá para pastar e, em poucas horas, está feito o serviço.

2) A LINGUAGEM DAS BANDEIRAS


Apesar de aberto para o mundo, solidário e hospitaleiro, o povo norueguês gosta de manter uma certa "solidão" ou "isolamento" e preza muito sua privacidade. As casas raramente são perto uma das outras. Assim, há uma prática de hastear bandeiras nas casas, com um significado ancestral, que vem de um tempo em que o único meio de comunicação era a própria presença humana.








Ainda que esse costume hoje esteja mais restrito a ocasiões de festas, batizados e outras solenidades familiares, ainda se vê, principalmente no campo, bandeiras hasteadas que significam o seguinte: se a bandeira não está hasteada, melhor não ir, de duas uma: ou não há ninguém em casa, ou simplesmente os donos não estão dispostos a receber visitas. 


3) OS TROLLS



Num país com tantas noites sem dias, é preciso haver muita mitologia para povoar os dias escuros. Dentre os muitos seres presentes na mitologia norueguesa, destacam-se os "Trolls", seres fantásticos, com fama de mal humorados e selvagens, que habitam as densas florestas e só podem sair de lá após o crepúsculo (que lá, no verão, ocorre entre meia noite e uma hora), pois se recebem um único raio de sol são imediatamente convertidos em pedra. Sim, há rochas que possuem o formato de troll (juro que vi, nuvens também).



Possuem um rabo peludo, 4 dedos, cabeleira grande e desgrenhada, cheiram mal, são longevos e vivem em "famílias". Comem muito e gostam de irritar os humanos.


Os camponeses, com medo dessa irritação e temendo que os trolls comam seus bichos, costumam deixar boas quantidades de alimentos do lado de fora das casas para saciá-los. Possuem poderes extraordinários e podem se transformar em qualquer coisa (gente, planta), mas a única coisa que neles não se transforma é o rabo. Quando um homem se apaixona, diz a lenda, por um garota especial, dá-lhe uma volta ao corpo, a ver se não há no seu traseiro um rabo disfarçado. Os trolls são inimigos dos gnomos que, assim como os Elfos, também habitam os bosques e florestas.


Entradas, janelas e portas das casas são adornadas com imagens de trolls. São para "afugentar" outros "maus espíritos".


Estas imagens de trolls são os souvenires mais vendidos na Noruega. Meus netos piraram nessa história (e você, não?).