quinta-feira, 2 de fevereiro de 2023

Cuiabá x Sábados PerVersos – Imersão poética

"Rua sem saída”, anuncia a placa no início da rua, na cidade de Santo André. Só que não é bem assim.

Adentrando a porta da última casa da rua Cuiabá, a de número 153, local onde a arte habita, penetra-se também no mistério e no encantamento. Se o visitante (que só poderá visitar o ateliê-casa mediante agendamento prévio), mostrar-se delicado, interessado e interessante, a proprietária do local, acabará por lhe mostrar a passagem secreta para o quintal/garagem e, finalmente, a saída para outra rua. Uma placa, portanto, nunca diz tudo. 

A Cuiabá 153 é um portal para um mundo a descobrir. Tudo ali respira criação e um certo ar de mistério.

Para os que acompanham a história do local e a rebeldia que ali ocorre há cerca de uma década, essa sensação já está introjetada. Chegam como quem é “da casa”, a rua (con)fundida ao Cuiabá 153 – Galeria, Espaço Cultural, Casa ateliê da artista visual Sueli de Moraes, ou simplesmente, Suca, como é conhecida e reconhecida.

Tudo ali começou com reuniões “descompromissadas” entre pares, depois, em 2014, veio a ideia da parceria com  um projeto realizado na França, Les Fenètres qui parlent”, onde reside uma de suas filhas. Assim, em diálogo com as janelas francesas, nasceu “Portões que Falam”, uma extraordinária instalação de arte pública, promovida em anos diferentes, por quatro edições, a pandemia atrapalhando no meio delas.  

A cada dois anos, Suca e os participantes da ação de arte pública, vão de casa em casa, não só da rua Cuiabá, mas em várias outras ao redor. Na última edição foram sete ruas. Conversam com os vizinhos, tentando convencê-los a ceder seus respectivos portões para a realização da intervenção. Foi difícil, mas ela e aqueles que toparam ser seus pares, conseguiram, tanto que na última mostra, 2022, participaram mais de oitenta artistas envolvendo o mesmo número de residências que cederam espaço para as intervenções.

Pois bem, feita essa longa introdução, necessária, no meu modesto modo de ver, para falarmos do que aconteceu ali no último sábado, 28 de janeiro.

O coletivo Sábados PerVersos, ligado à livraria e espaço cultural Alpharrabio, há oito  anos ininterruptos unido por suas reuniões mensais no espaço físico da livraria e outros locais, inclusive, virtuais, como nos dois primeiros anos da pandemia,  recebeu um sedutor convite de Suca que foi alegremente aceito.










A ideia era visitar a exposição “Além da superfície”, a primeira individual da jovem artista Vitória Fogaça, instalada e aberta à visitação de 02.12.22 a 04.02.23. Mas não seria uma visita qualquer. A sugestão foi de uma imersão poético-visual na mostra, ou seja, um diálogo entre as obras expostas e as possíveis leituras das visitantes, Vanessa Molnar, Rosana Chrispim, Ciça Lessa, Márcia Plana, Nathaly Felipe Alves, Isabela Agrela T. Veras, Luzia Maninha Teles Veras e a autora deste texto, além, naturalmente, das anfitriãs, Suca e Vitória. Dez mulheres, muitas histórias a se cruzarem. Muitos questionamentos e reflexões.

Após uma monitoria da curadora Suca, logo à chegada e da apreciação individual das obras expostas, seguiu-se uma imersão gastronômica em sabores e cheiros, a título de intervalo para almoço. 





A própria Suca, que entre as muitas habilidades, além de sua formação em arte, também é graduada em gastronomia e hábil na alquimia de sabores, foi para a cozinha que, diga-se, faz pare do ambiente. Preparou “nhoque” ou inhoque ou gnocco, em italiano, acompanhado de um espesso e perfumado molho de tomate e ervas secretas, mais uma saladinha e água aromatizada com folhas de manjericão, vinda dos canteiros laterais da casa.  Aproveitamos a ocasião festiva e abrimos umas garrafas de vinho, também para celebrar o aniversário de uma das visitantes presentes, Márcia Plana, que generosamente preparou um bolo de sabores igualmente misteriosos, para servir na sobremesa.


Plenas de ver, saborear e ouvir, fizemos uma roda de conversa com a Vitória, autora das 12 obras da mostra, em técnicas e materiais diversos.

Vitória nos disse que, a princípio, o trabalho nasceu numa pesquisa que vinha realizando sobre o corpo, presença e ausências; fases da infância, entre outras. Durante a primeira fase, uma série de inusitados desenhos em papel, que tiveram partes recortadas, no sistema calcogravura. Os pedaços recortados, foram colados a outros desenhos dando-lhes outros sentidos, numa segunda obra. 
















A artista também falou do uso do grafismo em meio aos desenhos, como “uma forma de complementar o que a imagem não sustenta”.  Durante o período de um ano, as ideias foram anotadas em cadernos, efetuadas, refeitas. Um longo processo que incluía conversas e trocas com a curadora Suca. 

Por fim, a aniversariante Márcia decidiu tirar uma selfie com cada uma das amigas presentes, ou quase.










A poeta tenta capturar o momento pós-imersão


A tarde caía sobre os paralelepípedos da Cuiabá, quando cada uma das presentes rumou para seus respectivos destinos, com a promessa de transformar essa experiência em arte ou qualquer outra coisa, um poema, uma crônica, um artigo, neste meu caso, dando por cumprida a imersão e vindo à tona com a promessa cumprida.

Dalila Teles Veras, início de fevereiro de 2023

10 comentários:

  1. moraesdesueli@gmail.com23 de fevereiro de 2023 às 02:25

    Dalila, que prazer ler e vivenciar novamente este Sábados PerVersos com a Cuiabá 153.

    Não é novidade o quanto gosto de te ler e ouvir. E ter o meu nome mencionado em seu blog, é sinceramente, uma honra.

    O seu artigo é um convite ao pertencimento. Se eu não fosse a Suca, certamente teria desejo de fazer parte dessa turma de cdf's (rs) só pra ter experiências tão bem descritas como as que
    tivemos no referido sábado.

    Amei a introdução, obrigada 🤩, as referências todas, as fotografias!... pra mim, um texto que não seria diferente do impecável.

    Só tenho a agradecer ao Universo por ter conhecido você, Maninha e a família Alpharrabio.

    O meu coração é só amor e contentamento pela experiência que tivemos neste sábado de arte, poesia, gastronomia e abraços. Até de Maninha ganhei um quase abraço. Um quase abraço dela é para poucos, pouquíssimos! :D

    Quiçá tenhamos mais encontros como este!
    Abçs
    Suca

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    1. Que bom ouvir isso de você, querida Suca. Seguimos, juntas, pela arte e a convivência fraterna entre pares. Abraços

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  2. Que lindo, Dalila. Você me transportou pro dia do encontro e permitiu que eu vivesse um pouco daquela emoção. E a Suca! Ela é uma mulher admirável que abre generosamente sua casa mágica. Quem já foi ao Cuiabá153, sabe bem o universo amoroso que é. Obrigada, Suca e Dalila, por tanto ❤️

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  3. Parabéns a todas que participaram desse encontro. O BLOG ficou ótimo. O texto puro sentimento poético. Que venham mais e mais encontros como este. Felizzzzzz 2023!!!!!

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  5. sanddrinhaoliva@gmail.com23 de fevereiro de 2023 às 17:34

    Dalila, Parabéns pelo tocante registro que produziu deste encontro tão especial que vivenciou junto a Suca e as demais artistas . Belo texto! A introdução, nos conduziu com curiosidade até a Cuiabá 153, conseguiu deixar esta linda casa , ainda mais interessante e acolhedora do que já é!!!

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